Bioeconomia é um termo emergente, que oferece definições diferentes ainda em disputa. Suas primeiras concepções e usos por instituições como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a União Europeia (UE) foram voltados à mitigação de emissões de gases de efeito estufa e transição energética de economias dependentes de combustíveis fósseis, o que não necessariamente estão ligados a valorização ou conservação da biodiversidade na Terra. (fonte: doc WRI)
O conceito de bioeconomia começa a ganhar forma em 1970 pelo economista romeno Nicholas Georgescu-Roegen. Georgescu-Roegen defendeu uma revolução na teoria econômica, para que considerasse os aspectos biofísicos do processo econômico, isto é, os impactos da transformação dos recursos extraídos da natureza em termos de dissipação de energia e geração de resíduos. Crítico do crescimento econômico material sem limites, alertava para a inevitável degradação dos recursos naturais em decorrência das atividades humanas. Com base nas contribuições do economista, o termo bioeconomia foi utilizado para se referir a recomendações políticas e tecnológicas ligadas aos fluxos de materiais e energia associados às transformações econômicas. (Fonte: artigo prof Sylvia Saas)
Ao longa das décadas o debate em torno da bioeconomia se intensificou e ganhou destaque na agenda científica, política, econômica e ambiental. (Fonte: WRI). Inspirada pela revolução biotecnológica e avanços da engenharia genética na década de 90 e mais recentemente pela associação à transição energética e à descarbonização das economias, a bioeconomia passa a ser incorporada na política dominante por instituições como a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a União Europeia e vários governos nacionais.
O debate contemporâneo sobre a definição de bioeconomia contempla três linhas principais segundo (fonte: WRI).
A bioeconomia biotecnológica tem foco prioritário no crescimento econômico e geração de empregos, no entanto o atendimento aos critérios de sustentabilidade fica em segundo plano. Consiste na incorporação de tecnologias intensivas em ciência no processo de produção e no pressuposto que tais tecnologias e a economia que dela deriva sejam ambientalmente mais eficientes e, por consequência, sustentáveis. O progresso técnico é assumido como fonte da criação de novos processos, insumos, resolução de problemas de disponibilidade de recursos, aproveitamento e destinação de resíduos. Destaca-se o protagonismo de plantas industriais de alto conteúdo tecnológico e a tendência à concentração empresarial e espacial dos segmentos setoriais e técnicos protagonistas no processo, em função das exigências de escala, capacidade tecnológica e investimento.
A bioeconomia de biorrecursos é guiado pela ideia de que a biomassa substituirá matérias-primas e combustíveis fósseis na produção de energia, buscando maior equilíbrio na ponderação entre crescimento e sustentabilidade dos produtos e processos. Consiste na introdução de inovações de produtos provenientes da natureza, que são a principal fonte de criação de excedentes econômicos: inovação em materiais naturais; manejo e boas práticas extrativistas, redução e aproveitamento de resíduos; sistemas de uso em cascata5 das mesmas matérias-primas e opções similares. Há aqui uma visão menos linear do processo pesquisa-ciência-desenvolvimento-consumo do que no caso da visão de biotecnologia, mas igualmente dependente de pesquisa e desenvolvimento científico. O aumento de produtividade e a intensificação do uso do solo, bem como a recuperação de áreas degradadas na produção de biocombustíveis, são apontados como vetores de inovação e crescimento. Processos que, no limite, levam a uma lógica mais ampla de homogeneização e não de diversificação.
A bioeconomia bioecológica consiste em sistemas econômicos nos quais o critério de sustentabilidade se sobrepõe aos de crescimento unilateral da economia. Em contraste às duas visões anteriores, busca a criação de excedentes econômicos a partir de processos em que prevalecem “promoção da biodiversidade, conservação dos ecossistemas, habilidade de prover serviços ecossistêmicos e prevenção de degradação do solo”. Além disso, reconhece as populações que vivem nessas regiões, seus saberes e culturas. Considerada uma economia rural e periférica, predominam, entre outros, povos indígenas, quilombolas e ribeirinhos cujo modo de vida e subsistência dependem da conservação da natureza e da biodiversidade, tão ameaçadas por atividades econômicas destrutivas atualmente. Os aspectos de pesquisa e inovação se apresentam como relevantes e tem como principais vetores as práticas orgânicas e ecológicas em substituição às técnicas convencionais de alto impacto ambiental negativo. Prevalece a busca de soluções locais produtivas/ reprodutivas baseadas em interações entre espécies e sistemas vivos criando sistemas de ciclo completo, com forte componente de circularidade, regeneração, justiça social e inclusão. Destaca-se, do ponto de vista socioecológico, a valorização dos conhecimentos dos povos tradicionais nas soluções mencionadas, embora ainda sejam pouco combinados com os conhecimentos científicos e tecnológicos.
Essa terceira abordagem da bioeconomia surgiu em países mega diversos do Sul Global, em especial aqueles que ainda contam com extensas áreas florestais biologicamente diversas e tão relevantes para a regulação do clima do planeta, como é o caso do Brasil. Ao adotar uma perspectiva econômica com base na biodiversidade e ênfase nas pessoas, tal abordagem é também reconhecida como bioeconomia da sociobiodiversidade. Segundo os autores, nessas regiões, as economias sociobiodiversas devem se basear em cadeias de valor que respeitem a resiliência dos ecossistemas e em funções ambientais que sustentem a biodiversidade, em contraste às demais abordagens de bioeconomia que apenas mitigam impactos ambientais negativos. Modelos baseados em biocombustíveis ou monoculturas florestais, por exemplo, geralmente são prejudiciais à biodiversidade e, portanto, contraproducente em regiões megabiodiversas. Reconhece-se a complexidade do componente social desta abordagem de bioeconomia em comparação com as demais, isso porque envolve importantes desafios territoriais e sociais que caracterizam países do Sul Global, entre eles a falta de acesso a recursos básicos, a dificuldade na regularização fundiária e a violência às populações locais por grupos que praticam ações ilegais.
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